sexta-feira, 20 de março de 2009

DIXIT: Miguel Torga, in Diário

Coimbra, 7 de Março de 1978:

Se ao menos certas horas se pudessem plasmar num poema! Mas não. A eternidade delas fica à mercê da memória frágil dos sentidos.

Coimbra, 8 de Março de 1978:

O dia inteiro a medir a extensão da minha miséria. Sim, escrevi penitentemente muitos livros. Mas de que valeu? São páginas em carne viva que me parecem sudários de letras mortas.

S. Martinho de Anta, 23 de Setembro de 1979:

Princípio de Outono. Os frutos amadurecem no quintal e as flores empalidecem no jardim. Há um estremecimento de morte na natureza. E esse arrepio de inquietação tem eco no meu sangue. Sinto-me em perigo de vida só pelo facto de existir.

Chaves, 31 de Agosto de 1988:

Cá estou eu novamente. A minha vida visível é um ritual ortodoxo.

Coimbra, 25 de Janeiro de 1989:

Parar o tempo...Por sabedoria ou por cálculo?

Coimbra, 21 de Dezembro de 1989:

Guerra civil na Roménia. O opressor estrebucha e massacra até ao último alento. Com raiva paranóica, quer arrastar consigo todo o mundo na voragem, como se preferisse eternizar-se na madição dum desastre colectivo do que render-se à História.